sábado, 12 de janeiro de 2008

Beethoven

O trabalho come-nos. Rói-nos a corda que comanda o tempo e dissolve-nos a energia até que dela resta apenas um desejo de estar muito quieto, debaixo de um livro e de uma coberta. Faço nova nota mental: 'pensa em alternativas'. Um amigo começou hoje mesmo uma formação para se habilitar a dar massagens. Ocorrem-me poucas ideias mais interessantes, mas também para isso é preciso orçamento e o empreendedorismo sempre foi a minha competência mais débil. Felizmente vão sobrando distracções. Para recuperar da catástrofe da peça "Catástrofe" (bom, lá foi o meu contributo anual à produção teatral portuense...), enchi-me de pouca esperança e visitei Espinho para uma soirée de dança contemporânea: um quinteto masculino tem sempre essa capacidade de apelo. Os meninos eram bem parecidos, o que nos fez esquecer completamente o overacting gestual (sim, também sem palavras se pode falar demais). Foi um bom pretexto para relembrar esse magnífico segundo andamento da sétima de Beethoven, que serviu também de banda sonora para o reencontro à saída com a I., esse corpo, cara e voz de metro e meio que irrompeu como uma chama na minha primeira adolescência. Vinte anos é muito tempo, mas ao vê-la o tempo comprime-se sempre até caber num nó de estômago e dissolver-se no suor nervoso da incomunicabilidade. Gostava mesmo de a ver, consigo dizer-lhe, agora que até dança por cá.