domingo, 30 de dezembro de 2007

Perspectives, de Georges Schwizgebel

sábado, 29 de dezembro de 2007

Shenzen - diário de bordo


O Natal afinal até tem coisas boas. Pelo menos serve de pretexto para rever amizades antigas como a nossa consciência. Recebo de uma delas todos os anos por esta altura um livro em italiano. É um idioma dentro do qual partilhamos memórias e travessuras, e gosto de o recordar desta forma. Desta vez, uma BD: Shenzhen, do canadense Guy Delisle. É basicamente o registo em banda desenhada do quotidiano do próprio autor, contado na primeira pessoa, de uma estadia de 3 meses nesta cidade chinesa, onde acompanhava a execução de uma animação para um canal francês (voilá, a globalização). Não há nada de extraordinário no relato, a não ser o confronto de um homem com a sua solidão cultural, e as dissertações, por vezes irónicas, por vezes carinhosas, acerca dos contrastes experimentados: a gastronomia, os horários, as viagens, as formalidades laborais e sociais, etc. O estilo é simples, mas eficaz, e funciona verdadeiramente como uma partilha. Senti-me imediatamente atraído por aquela necessidade de comunicar, numa situação de isolamento, sem recorrer à palavra, esse meio tão escorregadio e carente de versatilidade em certos momentos. Dá que pensar. Nota mental: não esquecer o moleskine.

sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

Benazir (1953-2007)


Covardia: 1
Democracia: 0

quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

A guitarra de Thurston Moore

O tempo tem-me permitido uma corrida diária de uma hora. Sinto a máquina do corpo a apurar-se, a respiração mais segura e os músculos mais firmes, o peso das emoções inúteis a jorrar em suor para a camisola. No leitor de mp3 tem rodado Benjamin Biolay, Bonnie Prince Billy, Juliette Greco e Thurston Moore, esse glorioso combat rocker que nos ofereceu o melhor concerto das nossas vidas numa noite de Verão em Paredes de Coura. Corro com esse som por cima das folhas mortas, da parte sul do parque até ao atlântico, onde invejo en passant os surfistas em planagem sobre as ondas. Lavo o corpo e os pensamentos, entro em comunhão com a erva, deitado a olhar para as cambiantes solares. Matuto apenas na corrida de São Silvestre e sorrio.

quarta-feira, 26 de dezembro de 2007

Mais cinema no Gato Vadio


O Mundo de Apu , Satyajit Ray. 1959. Dur.: 101m.
Quarta-feira, 26 de Dezembro, às 23h. Entrada Livre.
Gato Vadio. Rua do Rosário, 281 - Porto.

terça-feira, 25 de dezembro de 2007

Don't come knocking


Não desgosto deste tipo de história. Uma personagem crepuscular, em viagem retrospectiva pelas mossas causadas pelas glórias do passado, um misto de road movie e bildungs roman. E havia um plus, o reencontro de um casal adorável do cinema norte-americano: Sam Shepard, que também escreveu o argumento, e Jessica Lange, ambos já bem para além da idade autorizada pela indústria. E até há planos interessantes, que fazem eco com aquelas pinturas de abandono do Edward Hopper (não sei até se esta, que deu origem ao cartaz, é uma citação directa). Mas depois há Wim Wenders, esse peculiar e sobrevalorizado "fenómeno" cinematográfico, que parece ter os trunfos na mão, incluindo alguma mestria, para fazer um bom filme, e deita persistentemente tudo a perder com um produto final desorganizado e bacoco. Mas pronto, não deixa de ter recheio suficiente para se apresentar como uma boa alternativa ao jantar de farrapo velho do dia de Natal.

Amor de monstro versão t'shirt

domingo, 23 de dezembro de 2007

Devendra Banhart - A Ribbon


Vídeo de Michel Gondry

Caminhada no Soajo


Um passo a seguir ao outro, firme e ritmado, a respiração sincopada em sintonia. Uma inspiração serve para cada duas passadas estugadas. A subida ao monte também requer um esforço de abstracção, que o vento cortante e as pedras de geometria variável procuram contrariar, conferindo outra tessitura psicológica à chegada ao cume. A descida pelo vale é menos exigente, permitindo-nos divagar no bucolismo da luz do entardecer, o gorgulhar da água, as cores outonais e o abandono das árvores carbonizadas por incêndios recentes recortadas contra o céu. Pelo meio, uma pausa breve para retemperar energias mal me serve para esboçar uma chaminé num abrigo serrano. Caminhar é preciso. Viver não é preciso.

La Liberté guidant le peuple

Eu e o tio

sábado, 22 de dezembro de 2007

La grande ombre


Auguste Rodin, 1902-1904.

sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

Parque paranóia


Regresso às emoções aventureiras das idas solitárias ao cinema. Faço o meu filme privado enquanto aguardo pelo início da projecção e aproprio-me ao meu ritmo das imagens no grande ecrã. Desta feita, Paranoid Park, de um Gus van Saint capaz de algumas surpresas intermitentes. O ritmo do filme cola-se adequadamente ao sonambolismo próprio de uma certa adolescência, não como algo que a define, mas como um dos registos que caracterizam uma certa indiferença perante o mundo e o próprio futuro, um estado blasé mas sem o subtexto intelectual. Há momentos e planos - os travelings em câmara lenta a acompanhar os skaters nas suas manobras ou os grandes planos dos jovens - imbuídos de grande poesia visual. Consegue-se o equilíbrio perfeito entre a ausência de mensagem (no sentido político ou pedagógico do documentário tradicional sobre a juventudo desprovida de valores) e o tom intimista e confessional que é o do diálogo interior do protagonista, sem outra ordem aparente para além da que lhe é ditada pela dinâmica emocional da narrativa. Um pequeno achado, a ver (e ouvir) sem preconceitos.

Ser adulto é...

Júri de certificação. Um jovem sentado à minha frente, o olhar inseguro dentro de uma cara pálida e acne de fim de adolescência. Pergunto-lhe como tem corrido esta coisa de ser bombeiro desde os 14 anos e peço-lhe que me fale de alguma experiência mais desafiante deste seu breve mas nobre currículo. A primeira vez que saiu, diz-me, aos 15 anos porque a lei não permitia sair antes, foi por causa de um suicídio na linha de comboio. Fora incumbido de recolher a cabeça do sinistrado, o que resultou numa visão inolvidável. Uma outra vez fora chamado para socorrer uma criança com uma perna partida. A criança afinal era um bebé de seis meses, ao lado do qual esperou uma hora e meia pela assistência que não sabia prestar. Uma hora e meia a olhar impotente para um bebé a morrer. O impulso dos 15 anos foi mais forte e acabou por correr para o hospital, contrariando as regras da etiqueta hierárquica, que também existem nestas instâncias infernais. Não quis ouvir o desfecho. Pedi-lhe para falar do futuro. O olhar saltitante perdera o ritmo e concentrava-se já num ponto qualquer no ar à nossa frente. Ia jurar que se tinha esquecido que ia sair dali com o nono ano na carteira.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

Anti-postal de natal #2

terça-feira, 11 de dezembro de 2007

Chá e café...


... a Saint Germain des Prés.

Mais cinema à borla

O avanço paradoxal

O meu avião veio ontem de Paris. Eu ainda não aterrei.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

Anti-postal de Natal

Cinema do Gato Vadio - entrada livre

High finance

Manhã perdida na cave de um banco, para tratar de um crédito para ajudar a comprar o "novo carro". Se é verdade que para algumas coisas me sinto um cidadão do século XXI, as demandas financeiras atiram-me de regresso à sabedoria de um camponês da Idade Média. Ainda investi inicialmente com toda a minha concentração um olhar atento aos papeis que me iam colocando em cima da mesa, antes de os assinar. Pouco depois, contudo, fui vencido por um verdadeiro tsunami burocrático e dei por mim a assinar tudo o que fosse preciso para sair dali o mais depressa possível. Que saudades do tempo em que o meu espólio se podia concentrar numa caixinha de madeira e em dois bolsos de casaco.

Mimi's folies

terça-feira, 4 de dezembro de 2007

As travessuras de um escritor


Ao escritor peruano Mario Vargas Llosa, de quem lera o divertido 'A tia Júlia e o escrevedor' (parece que há uma versão no cinema com uma das minhas actrizes favoritas, a Barbara Hershey), reconheço a mestria no equilíbrio delicado entre a profundidade dos temas e a leveza aparente do texto. Agora, com 'As travessuras da menina má', consegue envolver-nos numa exuberante intriga amorosa que atravessa várias décadas, e a pretexto da qual se lança um olhar sobre o percurso histórico recente do próprio Peru (com ênfase nos seus contrastes sociais) e da Europa ocidental, detendo-se sobretudo no quotidiano de grandes urbes como Paris, Londres e ainda Madrid. O discurso, em tom confessional, é colocado na primeira pessoa, e não deixamos de pressentir ali uma forte imbricação com o percurso biográfico do próprio escritor, que já experimentara o registo da mélange autobiografia/ficção noutros textos (aparentemente, chegou mesmo a casar-se com a sua tia Júlia, e as incursões no mundo político - concorreu à presidência, perdendo contra Fujimori - reflectem-se em vários apontamentos no texto). Horas de leitura bem passada, e um bom aperitivo para a muito breve incursão parisiense...

Juliette Greco - "Sous le ciel de Paris"

Luz de Dezembro

Nenhuma obra de arte se aproxima, em beleza, à experiência inebriante de contemplação do mar. Isso é sobretudo verdade numa tarde de Dezembro, depois da chuva matinal ter afastado os transeuntes, respirando uma maré vaza mas intempestiva, sob um céu limpo de nuvens mas baço, a luz filtrada a dissipar a linha do horizonte e a imprimir reflexos dourados junto às rochas. A sul, a presença fantasmagórica da capela da Senhora da Pedra e a silhueta de um homem que passeia o seu cão. Ninguém mais em redor. Se me espreguiçar o calor entra melhor nas pregas da alma.

domingo, 2 de dezembro de 2007

Jornada no campo

Depois do rendez vous aguardado com a Jane Birkin no Teatro Aveirense, recolhi-me para a serenidade de Serém (o nome assenta-lhe como uma luva), e entreguei-me a uma espécie de Spa cerebral, feito de banhos de descontracção e ginástica mental, um mix de distenção contemplativa e expansão meditativa (ou se quiserem, grandes sonecas e muita tagarelice), mimos de gatos, observação prolongada de lareiras e demais composições campestres que, à falta de aparelho fotográfico, vão sendo registadas no papel à mão, à maneira dos antigos viajantes.

sexta-feira, 30 de novembro de 2007

Vacances

Já vou em contagem decrescente para uma semana de férias. Uma semana, sei-o bem, serve para apenas para deixar pousar no palato o doce sabor de se ser dono do próprio destino, o tempo suficiente para se tornar doloroso o regresso aos compromissos sociais. Vai saber bem, nevertheless, deixar de ouvir as músicas de Natal que rodam no gabinete há algumas semanas ou não ter que me concentrar nas exigências de um público carente de atenção e certificações. Guardo as energias assim para pôr o jogging e a natação em dia, marinar algumas ideias e refastelar-me num bom par de livros. O primeiro fim-de-semana será campestre, por carências de amizades várias e porque já não me lembro do som do vento nas folhas à beira-Vouga.

quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Milongas às quintas

É a última sessão do mês. Hoje relembramos a arrastadinha ou o sandwich? No sonoro, Carlos Gardel? Quantas vezes vou trocar de par? Não me posso esquecer dos sapatos, são os únicos que deslizam ("e a dupla sacada, já não sei se me lembro bem como faço", pensam eles para os seus cordões). A hora não passa. Ainda falta uma entrevista, depois um café, um jantar de família, e lá vou eu de encontro à felicidade de uma hora e meia de tango argentino. A milonga vai começar!

No restaurante dos preços sociais

Senhora de idade com ar contemplativo:
"- Diz que não se pode beber com os medicamentos..."
Senhor da mesma faixa etária responde:
"- Nah! À hora de almoço só faz bem!"

Jane Birkin


É já sexta-feira, no Teatro Aveirense que a musa de meia dúzia das mais interessantes cabeças criativas do final do século passado, modelo-actriz-intérprete-realizadora-argumentista (a parte da mãe-mulher-viúva também faz parte do plot, pelo menos em França), nos visita. Apresenta novo álbum, de onde saltou esta, dos Divine Comedy, que muito tem rodado no leitor da voiture.
"I really should be getting home/ they say it's where the heart is"

quarta-feira, 28 de novembro de 2007

Short Message Service

O telemóvel vibra em cima da mesa, na pasta, no casaco, por baixo da almofada, acrescentando novos capítulos haiku a um romance SMS. Nunca poderia prever que um pequeno Samsung preto, de ecrã luminoso, pudesse bulir assim com a vida da gente.

A vida continua?

O frio de uma cidade de granito, na margem direita de um rio de ouro, pede uma bebida quente. Entro num desses novos cafés trendy mas casual e peço, indeciso quanto ao sotaque a adoptar, um cappuccino, à menina de olhar curioso sobre o meu romance do Vargas Llosa. A saudade, essa maluca, continua a moer-me os dias. Deixa-me desnorteado, essa coisa de já não ser quem era há uns tempos atrás.
Ia espreitar na Fnac o show case (terceiro inglesismo em dois parágafos, tenho que estar atento) de um novo cantor italiano, mas fiquei paralizado com o trânsito de carros e pessoas, e decido deixar de lado a ideia de um roteiro de actividades culturais gratuitas, útil para curiosos tesos ou forretas. Esta semana já incluiu, desse roteiro, uma visita dominical a Serralves e duas matinés de cinema de animação.
Deixar de ser metade de dois para passar a ser um só tem destas coisas. Sobra-nos tempo e afecto, que investimos no universo.