sábado, 8 de novembro de 2008

Fome


O romance de um escritor controverso e que inspirou descendentes ilustres (no sentido estimulante do adjectivo) como Kafka ou Henry Miller - o norueguês Knut Hamsun. Aparentemente a novidade, para a época (1890), era o tom auto-contemplativo ou a deambulação do personagem sem uma linha narrativa definida, mas o que mais me atraiu no texto foi a possibilidade de rever mentalmente imagens de Oslo (à época, Kristiania) e de me cruzar com outras referências escandinavas. Quanto a isso, o romance não nos serve de grande coisa. O texto é de dimensão universal, e lida com questões maiores da condição humana. Mas estão lá a avenida Karl Johann, o palácio real ou os jardins-cemitério. Dia após dia, O protagonista, jovem escritor, divaga por lá, numa miséria definhada página após página, que parece não ter limites e desliza num esforço elíptico: escrever para poder comer, arranjar comida para poder escrever. De forma orgulhosa e pedante, vai rechaçando pelo caminho as hipóteses de saída, enquanto tudo aponta para um destino trágico que é contrariado por um final que não é senão uma saída de cena, em aberto. Para Paul Auster, que escreve o prefácio, esta é também uma entrada despojada no século XX.