sexta-feira, 8 de maio de 2009

Foste ao corte

A única altura em que dás conta da tua nuca, de que efectivamente ela existe lá também para ti, e não apenas no olhar dos outros, é quando te cortam o cabelo e no final te convidam a aprovar o serviço e a anuir no preço acordado. Cortas o cabelo, e é um acto tão repetido e sempre tão novo que cabe numa vida inteira. Para um homem, são dez a doze vezes por ano, numa epopeia capilar de 70 ou 80 anos. São 700 a 960 visitas a barbeiros, salões e casas de banho familiares. São o dobro disso em mãos atarefadas e de cuidados variáveis, entre cheiro a talcos e uniformes, incensos e cremes. Pensas nas vidas que passam e se contemplam no efémero reflexo, nesse arqui-inimigo do tempo que é o espelho. Pensas na doce batalha que travam com a sua auto-estima e enquanto abres a carteira, pensas em como seria mais fácil viver se todas as transacções fossem concretas e honestas como esta.